segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Polícia Civil e Ministério Público brigam sobre direito de investigar crimes no Estado


As duas instituições voltaram a se estranhar na quinta-feira depois de oito suspeitos, presos por tráfico de drogas em uma operação do MP, serem liberados pela Polícia Civil


Enquanto a lei segue inalterada no Congresso e o tema não é pacificado na Justiça, a Polícia Civil e o Ministério Público (MP) continuam em guerra pelo direito de investigar crimes no Rio Grande do Sul.
As relações entre as duas instituições voltaram a azedar na quinta-feira depois de oito suspeitos, presos por tráfico de drogas em uma operação do MP em parceria com a Brigada Militar, serem liberados na 3ª Delegacia de Pronto Atendimento da Polícia Civil, na Capital.
Embora a delegada Ana Luiza Caruso tenha justificado a medida sob o argumento de ilegalidades na captura dos suspeitos, afirmando que a BM não poderia cumprir mandados de busca e monitorar conversas telefônicas, para o MP o motivo da soltura faz parte de uma postura bem mais abrangente: um ranço da Polícia Civil pelo fato de o MP ter realizado a investigação.
Independentemente de quem tem razão, o assunto é polêmico e gera debates pelo país. Na Câmara dos Deputados, uma comissão especial discute a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 37, que dá poderes de investigação exclusivos para as polícias Civil e Federal. E, no Supremo Tribunal Federal (STF), tramitam ao menos oito ações diretas de inconstitucionalidade sobre o tema.
– A Constituição não diz expressamente que o MP pode investigar, mas deu poderes para denunciar crimes, e existem duas decisões da 2ª Turma do STF entendendo que, se o MP tem poderes para acusação, precisa dos meios para isso. Assim, implicitamente, poderia investigar – diz o advogado Otávio Piva, professor de Direito Constitucional das escolas superiores da Magistratura, da Magistratura Federal e a do Ministério Público.
Segundo Piva, a Corte ainda não se posicionou em definitivo e, enquanto o Plenário do STF não julgar, seguirá a confusão. Particularmente, Piva entende que o MP está certo:
– É preciso abrir mão dessa briga de beleza para o bem da sociedade.
Para especialista, divergências trazem prejuízos à sociedade
Alexandre Wunderlich, também advogado e professor de Direito Penal e Constitucional na PUCRS, é contra o MP investigar, mas admite que essa posição tem sido derrotada no STF e no Tribunal de Justiça do Estado.
Mesmo avesso ao poder investigativo do MP, Wunderlich afirma que, quando vai a campo, o MP faz um trabalho mais qualificado do que o dos policiais.
– No MP, os controles são mais rígidos, os advogados se sentem mais seguros, não ficam tão vulneráveis, sem negativas de acesso aos autos. A estrutura do MP é mais organizada, talvez porque seleciona o que vai investigar, enquanto a polícia tem de atuar em tudo – afirma o criminalista.
Conforme o sociólogo Juan Mario Fandino, do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a briga só traz prejuízos:
– Quando isso acontece, a sociedade se sente menos protegida e passa a confiar menos nas instituições de segurança.
As atribuições
BRIGADA MILITAR
Tem função de polícia ostensiva e preventiva, atuando nas ruas para evitar crimes e preservação da ordem pública. Não tem poder de investigação nem de realizar escutas telefônicas (a não ser quando se trata de crimes cometidos por PMs). Ao capturar um suspeito, a BM conduz à Polícia Civil para elaborar o inquérito policial.
POLÍCIA CIVIL
Apura infrações penais, exceto as militares e as de competência da União (atribuição da Polícia Federal). A partir da captura de um suspeito ou de registros de ocorrências, investiga crimes, elabora inquérito apontando suspeitos e o remete para apreciação do Ministério Público.
MINISTÉRIO PÚBLICO
Recebe o inquérito policial, analisa as provas e, dependendo do conteúdo, denuncia o suspeito à Justiça, manda arquivar o caso por falta de provas ou devolve o inquérito à Polícia Civil, pedindo novas investigações. É comum promotores darem sequências nas investigações para melhorar a qualidade do inquérito ou, por iniciativa própria, abrir inquéritos, independentemente da polícia, pois há entendimentos no STF de que o MP tem poder para isso.
O que pensam
Coronel Sérgio Roberto de Abreu, comandante-geral da Brigada Militar
Não vejo ilegalidade da BM em cumprir mandados, pois há um termo de cooperação de combate à criminalidade firmado pelo governador do qual fazem parte a BM, a Polícia Civil e o MP. A BM não faz investigação criminal, nem escutas, a não ser quando faz parte de uma estrutura conveniada como a existente.
Ranolfo Vieira Junior, chefe da Polícia Civil
Não tenho conhecimento do caso e por isso não posso avaliar se a decisão dela (delegada que liberou presos) foi certa ou errada. O promotor já me ligou antes, mas eu disse que não posso obrigar um delegado a lavrar ou não flagrante, como não posso ligar para ele pedindo para denunciar ou não alguém.
Marcelo Dornelles, subprocurador-geral para Assuntos Institucionais do MP
Vejo esse assunto com muita preocupação. Isso tem acontecido de forma reiterada. Duas vezes eu liguei direto para o chefe de Polícia e isso nunca se resolve. Vou procurar a Secretaria da Segurança Pública. O prejuízo é da sociedade. Está muito clara a postura de ser contra o trabalho do Ministério Público ajudado pela Brigada Militar. É uma disputa de classe pelo poder de investigar.
Discórdia entre autoridades
Casos recentes que colocaram em lados opostos o Ministério Público e a Polícia Civil no Rio Grande do Sul:
PORTO ALEGRE
— Em fevereiro de 2010, o então secretário municipal de Saúde, Eliseu Santos, é assassinado a tiro no bairro Floresta (foto ao lado). A Polícia Civil concluiu que o caso foi uma tentativa de assalto, mas dois promotores comandaram uma investigação à parte e apontaram homicídio premeditado, encomendado por pessoas prejudicadas em processo licitatório envolvendo a Secretaria Municipal de Saúde.
IJUÍ
— O Tribunal de Justiça anulou processo criminal contra uma suspeita de tráfico. O desembargador Nereu Giacomolli entendeu que foi ilegal o pedido do MP para que a BM cumprisse mandado de busca e apreensão em uma residência em novembro de 2011. Giacomolli mandou liberar a suspeita por entender que o mandado só poderia ser cumprido pela Polícia Civil. Policiais civis cumpriram novo mandado, e a mulher voltou à prisão.
GRAVATAÍ
— Em dezembro de 2011, a BM prendeu sete suspeitos de tráfico. Eles foram detidos durante o cumprimento de 32 mandados de busca e apreensão, expedidos pela Justiça, a pedido do MP. Considerando que houve abuso de PMs que conduziram os presos até um sítio para identificação antes de levá-los à delegacia, o delegado plantonista Júlio Fernandes Neto decidiu não autuá-los em flagrante. Os suspeitos foram soltos.
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NOTA DO EDITOR: Por uma absoluta falta de visão do nosso sistema político este é mais um  assunto que está pendente de uma decisão há tempo demais, pois é inegável que está a merecer uma atualização da regulamentação legal. O atual regramento legal que regula as atribuições das polícias está mais que desatualizado e  em desacordo com os interesses da sociedade. Será que alguém tem dúvidas quanto ao acerto e eficácia da confecção do Termo Circunstanciado (Lei 9.099) pela Brigada Militar ter-se constituído em um imenso avanço sobre a impunidade??? Eram inúmeros casos que mofavam nos escaninhos das delegacias de polícia e se constituíam em importante potencializador de corrupção e do aumento da criminalidade. Não é mais possível conviver com meias polícias que fazem trabalhos complementares, este é um modelo ultrapassado, em desuso no  mundo inteiro, urge a aprovação do ciclo completo para ambas as instituições policiais, pois somente assim se encerrará esta novela e a população como um todo será beneficiada. O recente embróglio acima narrado envolvendo a delegada de polícia é de fácil solução: se a prisão em flagrante pode ser executada por qualquer do povo, e ao policial compete sua lavratura por força de lei infere-se que, no mínimo houve prevaricação no exercício da função pública ao serem os criminosos liberados.  Enquanto a situação não se resolve, através da atualização da legislação  ou de uma decisão definitiva do STF, sofre o zé povinho pagador de impostos, ao bel prazer de delegados   que negam-se a cumprir com suas obrigações e não são responsabilizados na mesma medida. Até quando!!!

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